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Seguranças de RogĂ©rio Andrade tinham 'código de conduta' sobre comportamento, roupas e horĂĄrios: 'Quem dorme só tem direito a sonhar'

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Por Redação em 21/03/2024 às 02:06:42
Nesta quarta-feira (20), o MPRJ e a Corregedoria da PM prenderam 18 policiais apontados como seguranças do bicheiro Rogério Andrade. Todos são suspeitos de integrar a organização criminosa. Operação prende 18 PMs apontados como seguranças do bicheiro Rogério Andrade

Horários rígidos, maneiras de se vestir, cuidados com os carros do bando e atenção com os inimigos. Essas eram algumas das exigências feitas aos policiais que atuavam na segurança pessoal do bicheiro Rogério Andrade, segundo a denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ).

O grupo era formado por policiais militares, que recebiam salários de até R$ 7,6 mil para acompanhar, dirigir e proteger o contraventor e sua família.

De acordo com o MPRJ, os seguranças também agiam como um "exército particular", com armamento próprio, "realizando missões, guerras, rondas e abordagens".

Os investigadores acreditam que o bicheiro utilizava essa mão de obra especializada para responder a "ameaças de organizações rivais e de membros não corrompidos das forças de segurança pública."

Nesta quarta-feira (20), agentes do MPRJ e da Corregedoria da Polícia Militar prenderam 18 PMs apontados como segurança de Rogério Andrade, que foram denunciados por organização criminosa.

Vampiros

Do total de 36 seguranças pessoais que atuavam na proteção da família Andrade, 14 faziam parte do núcleo de confiança do bicheiro e trabalhavam no período da noite. Eles integravam o grupo de troca de mensagens por aplicativo batizado de "Vampiros".

Grupo de troca de mensagens dos seguranças de Rogério Andrade foi batizado de Vampiros

Arquivo pessoal

Os investigadores conseguiram interceptar mais de 14,5 mil mensagens trocadas, entre outubro de 2019 e maio de 2022. A rotina do grupo não parou nem mesmo durante o período que Rogério permaneceu foragido.

"Não quero questionamentos! Não tá satisfeito. Tá achando que trabalha muito. (...) Tá no lugar errado. Tá no cavalo, banca! Tá dobrando, banca! Quem tá com a patroa, é até as 19h ou até o término", dizia uma das mensagens de cobrança no grupo dos seguranças.

Segundo a denúncia, a falta de cuidado dos seguranças em mensagens no grupo "Vampiros" ajudou na identificação dos policiais envolvidos. Informações pessoais como datas de aniversários, número de documentos (CPF e RG), além de chaves Pix facilitaram a confirmação dos nomes.

A falta de cuidado dos seguranças no grupo 'Vampiros' ajudou na identificação dos policiais envolvidos.

Arquivo pessoal

Roupa social e cuidado com os carros

Entre as preocupações de Rogério Andrade está a apresentação de seus seguranças durante o serviço. Para trabalhar na proteção do bicheiro, o policial precisava usar sapato, calça e camisa social.

Em uma mensagem enviada pelo policial Marcos Antônio Alle Teixeira no grupo Vampiros, a ordem do chefe fica clara para todos.

"Boa noite a todos. Não tenho nada a ver com a vida de ninguém. Porém, todos sabem como tem que se vestir aqui. Sapato, calça e camisa social. Hoje ele (Rogério) me questionou que tem visto o pessoal caindo o padrão", dizia a mensagem.

Outro cuidado que os seguranças deveriam ter para trabalhar com o bicheiro era com os carros utilizados por eles. Cada um dos policiais era responsável por avisar sobre a necessidade de manutenção e por pagar por possíveis avarias causadas nos veículos.

Rogério Andrade quando foi preso

Reprodução/TV Globo

"Comunicar a todos que tomem cuidado com os veículos. Dirigir, no carona (limpeza, olhar óleo de motor). Eu abri a porta do Jetta e outro carro bateu. Paguei! Passos deu uma ré, amassou. (Ele) Pagou! Gavião amassou e arranhou e pagou! Tudo eu dou ciência a quem de direito. Olhem o carro antes de pegar. Porque se aparecer amassado vai pagar. Lembrando que tudo é filmado", orientou o policial Fábio Luiz Rebelo Ouro.

Sem cochilo e alerta com inimigos

Outra mensagem enviada no grupo mostra que o bicheiro mantém preocupação com ataques de inimigos. De acordo com um aviso postado pelo policial Valdir Campos Júnior, conhecido como JR. Play, o momento de maior perigo é à noite, quando os rivais podem tentar "pegar o 01".

"Só querem pegar o 01 (Rogério) à noite. De dia ta tranquilo", escreveu Júnior, que era um dos chefes do grupo.

Homens armados são vistos nas proximidades do condomínio do segurança de Rogério Andrade

O alerta ficou mais claro quando Júnior ameaçou os seguranças que estavam dormindo em serviço. O chefe lembrou a todos que "ele" (Rogério) via tudo e que quem fosse pego dormindo ia "ficar falando sozinho".

"Pro pessoal da noite que acha que depois de uma certa hora vai dormir. Quem dorme só tem direito a sonhar! Ele paga pra trabalhar!", alertou.

"Acho que ele tem visto pouca movimentação nos corredores e na garagem! Ele vê tudo! Então vou refrescar a memória de todos! Se for portado, vai ficar falando sozinho para las ruas do Rio de Janeiro! Perder essa moleza por sono é maluco. Falta de compromisso com a vida do vip e dos companheiros. Cuidado com a supervisão que agora filma", reforçou a ordem.

Reportagem compartilhada

Além de divulgar as escalas, os pedidos de troca de horário e reforçar ordens do chefe, o grupo "Vampiros" também servia para os seguranças avisarem sobre desdobramentos de processos que envolviam o "01".

No dia 12 de março de 2021, o clima no grupo ficou tenso quando Marcelo da Silva Dias, o Maromba, postou um link do g1 sobre uma denúncia do MPRJ apontando Rogério Andrade como mandante da morte do bicheiro rival Fernando Iggnácio.

Poucos minutos depois, Marquinhos postou um emoji com uma carinha assustada.

Na sequência, Júnior demostrou estar bastante preocupado e escreveu: "f*******deu".

Grupo de troca de mensagens dos seguranças de Rogério Andrade foi batizado de Vampiros

Reprodução

Ainda naquela noite, Marquinhos voltou a postar, dessa vez, com um trecho da reportagem que citava Márcio Araújo de Souza, que seria o responsável pelo pagamento de propina a policiais civis.

"De acordo com o MP, Márcio Araújo de Souza, outro denunciado, é um dos responsáveis pela segurança pessoal de Rogério Andrade", dizia a mensagem.

Júnior então decidiu colocar um ponto final no assunto e escreveu: "Aguardemos cenas dos próximos capítulos".

Contudo, no dia seguinte, Marquinhos postou um novo link: Justiça decreta prisão preventiva de Rogério Andrade e mais cinco pela morte de Fernando Iggnácio.

"Saiu mandado de prisão", escreveu Marquinhos.

R$ 207 mil por mês com segurança pessoal

Segundo a denúncia do MPRJ, o bicheiro Rogério Andrade gastava mais de R$ 207 mil por mês com sua segurança pessoal. Ao todo, 36 homens trabalhavam para o contraventor.

Em maio de 2022, os investigadores encontraram uma planilha em um dos imóveis de Rogério com todos os gastos do bicheiro com sua equipe de segurança particular. Os agentes acreditam que a estrutura existia desde abril de 2021.

Os PMs contratados para o serviço recebiam entre R$ 5,6 mil e R$ 7,6 mil, de acordo com a patente que tinham na corporação militar do estado.

Além de toda preocupação com a rotina dos seguranças, Rogério mostrava que confiava nos policiais que trabalhavam para ele. Isso porque, em um ano, apenas um funcionário do grupo foi trocado.
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