Vendedores possuem o título de Patrimônio Cultural e Imaterial da cidade desde 2012. Rio tem 288 profissionais legalizados. Quem exerce a atividade irregularmente pode ter a mercadoria apreendida. Mateiros: 5 curiosidades sobre os vendedores de mate das praias do Rio"Olha o mate, olha o limão – geladinho!" Por trás da famosa frase estão ambulantes e símbolos de uma das tradições mais refrescantes do Rio de Janeiro. Os vendedores de mate em galões das praias apostam na regulamentação para manter a importância da atividade e afastar maus profissionais. Vindos de vários pontos da cidade, eles dizem que o comércio da bebida é uma forma de reconhecimento pessoal e profissional."O sol esquentou, a gente vê que vai dar praia, e vamos preparar o mate. Verão, sol, praia e mate", conta Jurema Ventura, que comercializa a bebida há 16 anos.Os mateiros possuem o título de Patrimônio Cultural e Imaterial do Rio de Janeiro desde 2012. O reconhecimento se deu por serem figuras tradicionais que fazem parte do estilo de vida do carioca (veja outras curiosidades no vídeo acima). A capital fluminense possui, atualmente, 288 mateiros legalizados, com alvarás da Prefeitura do Rio para vender a bebida e biscoito de polvilho nas praias de toda a orla do município. No último ano, foram 195 profissionais regularizados. A ideia do poder público é que mais vendedores sejam treinados e legitimados a cada ano e que esse número se multiplique. O processo de regulamentação dos vendedores de mate começou em 2021. De acordo com a Subprefeitura da Zona Sul, que coordena esse processo, os profissionais que comercializam esse tipo de produto precisam da legalização. Caso contrário, estão exercendo a atividade irregularmente e podem ter a mercadoria apreendida. Torneira protegida em galão com adesivo da Prefeitura do RioCristina Boeckel/ g1Rainha da praiaA ambulante Jurema Ventura ama todas as praias do Rio, mas os xodós são a Barra da Tijuca e o Recreio dos Bandeirantes. Foi levada para as areias pelo filho, que já vendia mate, e queria melhorar a saúde mental da mãe."Eu comecei a vender mate com o meu filho. Eu tive uma depressão. Meu filho, que trabalhava aqui na Praia da Barra, começou a me chamar para ir com ele. Para sair e arejar. E eu comecei a me sentir bem."A participação era, principalmente, anotando o fluxo de caixa. Pouco tempo depois, o filho de Jurema morreu de infarto, aos 24 anos, na praia. Ela resolveu, então, tomar para si a atividade."Salvou a minha cabeça. A venda do mate me levantou, me fez ficar forte. O mate trouxe a minha energia. Eu trabalhei aqui para me erguer", destacou Jurema.Além dele, Jurema tem outras seis filhas e faz questão de dizer que a regulamentação da profissão é um alívio."Eu me sinto honrada, tranquila, não tenho preocupação. Não tenho estresse e nem aborrecimento com nada", disse.Jurema Ventura trabalha como vendedora de mate há 16 anos nas praias do RioCristina Boeckel/g1EspecializaçãoOs mateiros passam por um processo de capacitação para aperfeiçoar a habilidade de produção da bebida e a forma como servir os clientes. A iniciativa é da Subprefeitura da Zona Sul e conta com as equipes do Instituto Municipal de Vigilância Sanitária, Vigilância de Zoonoses e Inspeção Agropecuária (Ivisa-Rio).Para manter a legalização, é preciso pagar anualmente a Taxa Anual de Uso de Área Pública (TUAP) no valor de R$ 94,83. O registro permite trabalhar em qualquer parte da orla do Rio de Janeiro."Temos que estar de touca, com uma roupa adequada. Eu tenho um avental, calça comprida e o tênis. Quando vamos fazer o mate temos que estar com as mãos preparadas, limpas e com unhas cortadas", explica Jurema.De acordo com Flávio Valle, subprefeito da Zona Sul, manter uma boa relação com os vendedores de mate é importante para a imagem da cidade."A gente se juntou à Vigilância Sanitária para poder oferecer um curso que ensinasse os processos para que o produto entregue seja de acordo com as normas sanitárias. A forma de manejo, a forma de preparo. Tudo o que a Vigilância Sanitária orienta para os estabelecimentos também é válido para como você prepara o mate: a temperatura ideal para acabar com os micro-organismos, a lavagem do galão, como a torneira deve ser preservada, o transporte até chegar à praia", disse Valle.Água filtrada e higienizaçãoO curso de boas práticas em que os mateiros recebem orientações sobre higiene e tratamento dos clientes dura cerca de duas horas.Os técnicos destacam que o fundamental é mostrar para os vendedores a importância de evitar a contaminação no processo de produção. O curso destaca a importância do uso de gelo, água adequada e erva mate de boa qualidade para que o produto possa ser comercializado. O gelo deve ser filtrado, adquirido de estabelecimento licenciado e com rotulagem completa. O transporte também deve ser feito evitando a contaminação.O curso usa como exemplos várias marcas de erva mate, mas destaca que ela tem validade de 24 horas e deve ser transportada em recipientes próprios e limpos. A água deve ser filtrada, guardada em limpo e não deve ficar exposta ao sol.Os produtores do mate bebido nas praias também são orientados sobre a forma adequada de lavar frutas e vegetais folhosos, para as versões do mate de praia que levam frutas como limão ou maracujá.Os galões devem ser lavados em água corrente antes e depois do uso, com um detergente neutro e uma esponja exclusiva para esta finalidade, para evitar a contaminação. As torneiras dos recipientes merecem atenção especial para a retirada de todo o resíduo. Elas também devem ser protegidas durante o transporte até a praia e nas areias com filme ou saco plástico descartável.Durante o preparo da bebida, os mateiros devem usar calçados fechados, protetores como toucas para os cabelos e os uniformes devem estar em boas condições de higiene. As unhas devem ser curtas e limpas. Barba e bigode devem ser raspados ou protegidos na hora do preparo do mate.MarketingJuninho do Mate trabalha nas praias da Zona Sul do Rio e sente orgulho de ser um símbolo do RioCristina Boeckel/g1Os vendedores do Rio não possuem parceria formal com nenhum fabricante de mate. Eles contam que a empresa que possui nome nos uniformes não está relacionada à marca. Inclusive, uma das reivindicações da categoria é a definição de um uniforme oficial para os mateiros do Rio. Fora isso, estão abertos a ações publicitárias, parcerias com empresas e, em muitos casos, trabalham em eventos privados.Juninho do Mate, nome pelo qual Alexandre Ribeiro dos Santos Junior é conhecido na orla do Rio de Janeiro, também trabalha nas praias há 16 anos. Ele começou no comércio das praias do Rio vendendo cerveja e água, mas migrou para o mate e abraçou a categoria."Quando tem sol a gente consegue vender tudo ou quase tudo. São dois produtos: mate e biscoito, que sempre todo mundo quer. Na praia ou até na rua a gente acaba atendendo as pessoas", contou Juninho.Juninho do Mate usa boné personalizado nas praias do Rio de JaneiroCristina Boeckel/ g1No início, trabalhava na Praia de Ipanema, mas o Leme é seu point atual, onde está a maior parte da clientela. Mesmo assim, ainda aparece no Arpoador e reencontra os clientes mais antigos, que têm confiança na venda do mate com um vendedor cadastrado."Dá segurança saber que está tomando um mate feito com água limpa, filtrada. E eu acho importante para eles, como trabalhadores, se organizarem dessa forma", disse a administradora Victória Couto, consumidora do mate do Juninho.As aparições sempre são com o tambor decorado com vários adesivos e com um boné com o nome de trabalho, acompanhado de uma caricatura dele levando mate e biscoito. A ideia da imagem profissional surgiu com a ajuda de um cliente que é especialista em marketing e o orientou a se destacar criando uma marca.Casado, pai de dois filhos, planeja expandir os negócios. Quer servir mate em todo o país. Sempre sorridente, ele faz questão de sempre lembrar do status de patrimônio da cidade."Somos um cartão postal do Rio de Janeiro. Temos que estar sempre com o melhor produto, um sorriso, em harmonia com os clientes", destacou Juninho.Segundo ele, a regulamentação da categoria é importante para os próprios profissionais."Legalizado e com a sua licença da prefeitura, capacitado para estar aqui, com o curso da Ivisa-Rio, que aí ele vai estar totalmente preparado para estar na areia atendendo a todos", afirmou.Sonhando altoGilmarrrr do Mate trabalha na altura do posto 9, em Ipanema, há mais de 20 anosGilmarrrr do Mate/ Arquivo pessoalGilmar Santana da Silva, o Gilmarrrr do Mate (as 4 letras R são para destacar a marca própria) tem como point no Rio o Posto 9, em Ipanema. Foi um dos primeiros mateiros a ter o trabalho regularizado pela Prefeitura do Rio. O vendedor começou a trabalhar com o mate em 2002. O reconhecimento do poder público veio quase 20 anos depois do dia que colocou o galão nos ombros pela primeira vez. "É muito importante porque passa transparência e dá visibilidade. Isso abre as portas quando faz evento. Até os estrangeiros têm um outro olhar, porque estamos com um símbolo da prefeitura. Estamos lá, emplacados, bonitões", disse Gilmarrrr.Inicialmente, o trabalho como mateiro não era a primeira opção. Ele trabalhava como cobrador de ônibus e, nas horas vagas, complementava a renda com a venda de mate e biscoito na praia. Com o processo de automatização da função que exercia, ele acabou sendo demitido. Assim, assumiu a função como a principal para sustentar a família que, destaca, conta com 8 crianças entre filhos e afilhados.Assim como Juninho, Gilmarrrr também usa um boné customizado com seu nome (com os 4 Rs) e um copo de mate ao lado de um pacote de biscoito de polvilho.Gilmarrrr afirma que o segredo para atrair o consumidor é a positividade e fazer com que o consumidor se sinta especial. Segundo ele, é preciso ser comunicativo, atencioso e carismático. Além dos sabores tradicionais de mate, ele oferece limão e maracujá com gengibre e hortelã. "Tem que estar bem trajado, com as vestes do mate. Muitas vezes as pessoas estão carentes de receber um bom dia nas areias", contou.O trabalho de vendedor de mate passa por mais espaços do que só oferecer o produto nas areias. Ele conta que é preciso frequentar com assiduidade a Ceasa para comprar as matérias-primas mais baratas.As vendas de mate têm um pico entre os meses de outubro e março. De acordo com Gilmarrrr, depois elas ainda existem, mas em um ritmo menor. Para ele, uma ideia para driblar a queda é ter autorização para vender em outros pontos do Rio."A nossa licença é para praia, para a orla. Queremos atender em outros lugares, como a Quinta da Boa Vista, o Cristo Redentor, a chegada da maratona, quando as pessoas estiverem com sede", destacou.Praia de Ipanema, na Zona Sul do Rio de JaneiroCristina Boeckel/ g1